Igrejinha da UFSC: uma santa anedota
Por Clóvis Werner, em setembro de 2015
Há pouco mais de 10 anos, fui interrompido na minha sala de trabalho para atender um senhor, visitante da cidade, que queria saber um pouco da história da atual Igrejinha da UFSC. E como eu havia estudado na graduação e no mestrado sobre o bairro, fui indicado para contar-lhe um pouco dessa história.
Era um senhor que devia ter uns 60 anos, magro, de aparência simples, vestindo roupas muito discretas, de cores neutras, apagadas, que pareciam deixar o seu semblante com um aspecto ainda mais humilde.
Como eu não estava com tempo para rodeios, fui logo dizendo: Eu não sei o que o senhor sabe de Cultura Açoriana, o que o senhor conhece de religião católica, de arquitetura de igreja, e de festas do Espírito Santo. Então, vou contar-lhe um pouco do que aprendi com as minhas pesquisas, e o que o senhor não entender, ou quiser mais detalhes, o senhor me pergunta. Diante da expressão de concordância dele, continuei.
Aqui é a sede do DAC – Departamento Artístico Cultural da UFSC. Estes três prédios faziam parte da igreja da Paróquia da Santíssima Trindade, e foram adquiridos e reformados pela UFSC em fins da década de 1970. O edifício da Igrejinha tem cerca de 150 anos. A torre original ficava ao lado do edifício. A construção desta igreja seguiu um traçado trazido pelos açorianos, uma tradição de quando a rainha “Santa” Isabel devotou Portugal ao Espírito Santo, influenciada por monges no início do século XIII, em cumprimento de uma promessa religiosa. Segundo essa tradição, muitas igrejas dos Açores têm um edifício menor, construído ao lado da igreja, denominado de Casa do Divino ou Teatro do Divino, que serve para os cultos públicos ao Divino Espírito Santo. A festa do Espírito Santo acontece na época de Pentecostes, 50 dias depois da Páscoa, em memória da descida do Espírito Santo sobre os apóstolos nessa ocasião. Cem anos depois, meados da década de 1950, a Igreja do bairro construiu o Salão Paroquial entre os dois edifícios, no terreno que antes era o caminho para o cemitério, até então tradicionalmente localizado nos fundos das igrejas. Quando a UFSC comprou o terreno com os edifícios, reformou-os e destinou-os para as Artes: a Igrejinha é a sede do Coral da UFSC, o antigo Salão Paroquial é o Teatro da UFSC e a Casa do Divino é um espaço para outras oficinas de arte.
Espero que o senhor tenha conseguido acompanhar e tenha compreendido a minha explanação. “— Sim, entendi”. Afinal, quem é o senhor? O que o senhor faz, qual a sua área de atuação? Com que o senhor trabalha? “— Eu sou dom Angélico, o bispo da nova diocese de Blumenau!”. “Ah! Então eu acho que o senhor entende um pouquinho de Igreja…” Disse-lhe eu brincando — respeitosamente.
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Esse texto foi escrito em setembro de 2015, como base para um texto em inglês, que deveria ser em formato de anedota, num exercício do curso extracurricular de língua estrangeira que eu frequentava na UFSC. O texto relata as minhas lembranças de uma situação real ocorrida por volta de 2005.
Hoje, 15 de abril de 2025, ao ler sobre o falecimento de Dom Angélico Sândalo Bernardino (Saltinho, 19 de janeiro de 1933 – São Paulo, 15 de abril de 2025), lembrei desse texto que ainda guardo com carinho, e que registra aquela visita tão especial ao DAC, na Igrejinha da UFSC.
Clóvis Werner, servidor aposentado – DAC/SeCArtE/UFSC.