III Festival de Música da UFSC chega de cara nova

12/07/2012 14:25

Publicado [originalmente na página www.secult.ufsc.br] em 09/07/2012 às 15:04

 

Seleção por curadoria, pocket shows em vez de composições únicas, auditório fechado em vez de palco ao ar livre: terceira edição do evento quer mostrar para o Brasil o que há de melhor na música local

 

 

 

Festivais de música costumam ter vida curta: chegam, encantam e morrem como as borboletas. Fugindo à efemeridade, o Festival de Música da UFSC não apenas vinga, como alça voos maiores. Amparado em um processo contínuo de valorização da música local ao longo dos 26 anos do Projeto 12:30, o evento caminha para sua terceira edição já consolidado. Tendo à frente o músico e coordenador do 12:30, Marco Valente, uma comissão da Secretaria de Cultura da UFSC já começou a trabalhar para que a edição deste ano seja uma mostra de excelência sem precedentes e um pólo propulsor da qualidade musical de Santa Catarina. Completamente remodelado, o evento deverá acontecer em 17 e 18 de novembro, não mais ao ar livre, mas no auditório Garapuvu, do Centro de Cultura e Eventos da UFSC.

Dentre as principais mudanças que estão sendo preparadas pela comissão organizadora está a forma de seleção dos grupos participantes do festival, que não ocorrerá mais através de inscrição e escolha posterior por uma comissão julgadora. No III Festival, os participantes serão eleitos por processo de curadoria. O novo formato, proposto por Marco Valente e aprovado pelo atual secretário de Cultura Paulo Ricardo Berton, tem o objetivo de fortalecer o evento como mostra de excelência musical e tirar de vez o caráter de competição. O processo de curadoria, que já começou, tomará como base a participação dos grupos no Projeto 12:30, considerando critérios como qualidade técnica, domínio de palco, pontualidade, estrutura profissional, entre outros.

Outra mudança importante: os grupos não serão mais selecionados por uma única composição, como nas edições anteriores, mas por trabalhos musicais alongados que sustentem um pocket show. Significa que os participantes deverão apresentar um pequeno show, com produções mais extensas, como um pout-pourri ou uma sequência de composições. “O que queremos é promover uma convivência maior dos grupos com o público para que essa oportunidade de contato seja melhor aproveitada”, explica Valente. O coordenador do evento explica que dessa forma, em vez de premiar os que fazem composições aleatórias e esporádicas, o festival passa a incentivar a carreira de grupos mais persistentes, que têm demonstrado profissionalismo e dedicação à arte através do Projeto 12:30, que é o grande berçário da música em Florianópolis.

Todas as inovações em curso têm um endereço: a qualificação do festival como mostra do que há de melhor na música local. A Secretaria de Cultura tem em mira a projeção nacional dos músicos que já estão há algum tempo na estrada e já provaram sua seriedade e talento nos palcos do 12:30. “Queremos saltar do patamar amadorístico para o profissional”, explica o baixista. Dentro desse conjunto de mudanças, o grande diferencial do evento continuará o de ser um festival universitário, não pelo caráter estudantil e iniciante das composições, mas pelo caráter científico: música exige um processo de pesquisa e conhecimento, diz o secretário Berton. É nesse sentido que a realização da mostra ao ar livre não se justifica mais. “Uma mostra de excelência requer um auditório também de excelência, em condições de concentração e acústica para avaliar e apreciar”, complementa o secretário.

Dentro do objetivo de promover a qualificação do meio musical, o evento terá a participação do compositor, arranjador, tecladista e produtor musical Carlos Trilha, ele mesmo um exemplo de trajetória e persistência profissional bem sucedida que o evento quer valorizar.  Além de fazer um workshow (apresentação comentada) Trilha será um observador crítico da produção local.

É só a ponta do iceberg de uma avalanche de transformações que estão para acontecer a partir desta edição. No próximo ano, o Festival de Música da UFSC terá oficinas, workshops, feiras de livros sobre música, feiras de instrumentos, orquestras e uma série de outros incrementos que já estão na pauta de quem não se contenta apenas em vingar, mas quer fazer crescer.

 

 ENTREVISTA: Marco Valente

 

“Temos em mira a produção de um evento de alcance estadual”

 

 

 

 

1 – Como será o Festival de Música da UFSC deste ano? Quais as principais mudanças operacionais e conceituais estão sendo preparadas?

MARCO VALENTE – O festival acontecerá em ambiente fechado no auditório  “Garapuvu”  no Centro de Cultura e Eventos da UFSC, não será mais ao ar livre. Isso veio ao encontro de alguns anseios tanto por parte de nós, organizadores, como por parte dos artistas; de que forma? Tivemos alguns problemas com relação a atividades que permaneceram acontecendo após as 22 h que causaram alguns transtornos e que sequer tinham realção com o festival. Queremos oferecer maior conforto aos artistas e ao público, além do que, faremos uma substancial economia financeira.

No que tange à parte conceitual, queremos devolver à música o status de excelência, afinal, estamos numa instituição de ensino superior que trata toda e qualquer área profissional com o devido respeito e valor. Com a música não pode ser diferente, pois além de arte ela é ciência. Há anos ouvimos uma reclamação unânime de que Florianópolis não possui mercado para a música, que o músico é desvalorizado, que os poucos espaços para que trabalhos possam ser mostrados são precários e ainda assim, não se abre espaço para a música autoral. Com o espírito de fomentar este mercado é que o Festival de Música da UFSC passará definitivamente a atuar.

2 – O que se espera principalmente com essas inovações conceituais?

MARCO VALENTE – O que se espera é valorizar o músico e a música local, oportunizar a discussão a respeito de todas as etapas e setores envolvidos com o processo de elaboração e fomentação do mercado musical local, tanto na área de educação como de produção, bem como porporcionar o contato do público com os trabalhos de qualidade que se faz por enquanto na grande Florianópolis, pois, não perdemos o foco de que o grande objetivo é um dia poder abranger todo o Estado de Santa Catarina.

3 – Essa redefinição tem a ver com a mudança na administração da UFSC e na Secretaria de Cultura?

Não, as inovações não têm nada a ver com a mudança na administração. Desde sua primeira edição, temos a convicção de tratar a música como ela realmente deve ser tratada, ou seja, como arte, educação, produção, mercado de trabalho e etc. São coisas que trago ao longo de 37 anos de convivência com toda a história e dificuldades que a música enfrenta.

4 – Você se inspirou em outros festivais para encontrar esse novo formato?

MARCO VALENTE – Não, o formato do festival tem tão-somente como inspiração experiências vividas e o conhecimento do mercado musical local. É, sobretudo, resultado de conversas sobre os anseios da classe musical, incluindo músicos que participaram das edições anteriores. Mas se fosse para citar um festival que eu tomo como referência, não como modelo, pois os propósitos são diferentes, seria o de Itajaí, que é um evento também voltado para a excelência musical.

5 – Quem vai selecionar as músicas e segundo que critérios?

MARCO VALENTE – O Projeto 12:30 passa a ser uma ferramenta de suma importância no processo de seleção dos participantes do festival.  Através da análise de requisitos que serão avaliados desde o momento em que será feito o contato com a coordenação do projeto  culminando com a apresentação dos grupos. Em resumo, a assiduidade na entrega do material solicitado pelo Projeto 12:30 nos moldes em que ele exige, no horário estabelecido para que a produção inscrita se apresente no local e no dia estabelecidos, na conduta perante a equipe de coordenação e equipe técnica e, por fim, na qualidade musical do que será apresentado, desde a qualidade de composição em todas as suas etapas, até a qualidade na execuçãoem si. Dessa forma, uma equipe de curadoria do Festival de Música da UFSC terá parâmetros para avaliar se determinado trabalho musical tem ou não condições de participar.

6 – Mas você que está à frente do 12:30 há 10 anos não teme que passando a selecionar por sistema de curadoria os trabalhos musicais que vão participar da mostra o evento perderá o papel de dar impulso a bandas e músicos iniciantes?

MARCO VALENTE – Muito pelo contrário, hoje só na grande Florianópolis, temos trabalhos musicais de qualidade suficiente para alçar vôos muito mais altos, ou seja, com toda a tranquilidade se submeter a mercados maiores, como Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e por aí a fora. Estímulo maior que esse não existe, afinal de contas estamos pensando no crescimento e valorização dos nossos músicos que já tem alguma estrada. Está aí a meu ver, a grande missão deste festival. Vamos colocar uma estrutura de altíssimo nível técnico para que possam apresentar seus trabalhos de forma condizente. O Projeto 12:30 continuará sendo um grande “berçário” musical de novos artistas. Trabalhos que hoje começam a galgar degraus mais altos passaram e ainda passam pelo projeto, tais como a “Somato”, “Karibu Trio”, “Cultivo”, “Habitantes de Zion”… Desejamos muito que outros grandes trabalhos surjam e que possam um dia estar se apresentando no Festival de Música da UFSC. O Projeto 12:30 tem 26 anos e o Festival de Música da UFSC vai para o seu terceiro ano, no entanto, a partir deste ano ambos se tornarão peças vitais um para o outro.

7 – Haverá premiação e publicação dos trabalhos selecionados?

MARCO VALENTE –  Estamos estudando uma forma de contrapartida aos músicos participantes do festival, mas como não se trata de uma competição, a figura da premiação não se adéqua. Uma possível publicação dos trabalhos está sendo estudada, mas ficará a critério da comissão organizadora.

8 – O Festival de Música da UFSC vai continuar crescendo este ano, como cresceu da primeira para a segunda edição? E qual é a sua expectativa para o futuro em termos de dimensão e repercussão deste evento?

MARCO VALENTE – Pelo fato de que a partir deste ano o festival passará a acontecer no interior de um auditório (Garapuvu localizado no Centro de Cultura e Eventos da UFSC), eu vejo que teremos um salto qualitativo enorme em termos de condições técnicas. Isso consequentemente gerará um crescimento, dará ao festival um caráter muito mais artístico e um status de excelência à música, o que no meu ponto de vista se enquadra perfeitamente na filosofia de uma instituição de ensino superior quando esta se compromete a dar um retorno à sociedade.

Quanto à expectativa com relação ao futuro, essas mudanças têm a ver diretamente com um projeto bem maior a ser implantado já a partir da edição do próximo ano, que no momento está sob sigilo absoluto, mas justificará as mudanças deste ano, disso não há dúvidas.

9 – Grande parte das iniciativas de eventos nessa área acaba morrendo na primeira ou segunda edição. Você acredita que o Festival de Músicada UFSC vai vingar?  Por quê?

MARCO VALENTE – Acredito. Desde sua primeira edição, tudo foi muito bem pensado principalmente pelo fato de que visamos à melhoria de condições para quem trabalha e se dedica à música, sem deixar de lado a preocupação com o seu maior estimulador, o público. Temos o compromisso, levando-se em consideração que trabalhamos com arte, de formar opinião, de formar público, de fornecer condições de acesso a quem tiver interesse em conhecer a música bem feita, e não digo isso com uma visão elitista, muito pelo contrário, penso que todos devem ter livre acesso à arte em todas as suas manifestações.

10 – E você acredita que, apesar de estar indo apenas para o seu terceiro ano, esse evento já provocou algum impacto no meio musical?

MARCO VALENTE – É só consultar os músicos que participaram das duas primeiras edições para se ter ideia da colaboração e da “oxigenação” que o Festival de Música da UFSC trouxe ao mercado musical local. Praticamente todos os dias sou abordado por pessoas que indagam sobre o festival, se acontecerá ou não, torcendo para que consigamos realizá-lo de novo. Creio que isso seja um indício sintomático sobre o impacto e a aceitação do evento.

 

Texto e entrevista: Raquel Wandelli

Jornalista da UFSC na Secult

e

37219459 e 99110524

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